Eleições 2020: entrevista com o candidato Guilherme Boulos
Candidato do PSOL em uma chapa com Luiza Erundina, Guilherme Boulos é o destaque da esquerda nas Eleições 2020 para a Prefeitura da cidade de São Paulo. O político possui fortes ligações com causas sociais como o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e alega estar mostrando uma política diferente em sua campanha.
Candidato do PSOL em uma chapa com Luiza Erundina, Guilherme Boulos é o destaque da esquerda nas Eleições 2020 para a Prefeitura da cidade de São Paulo. O político possui fortes ligações com causas sociais como o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e alega estar mostrando uma política diferente em sua campanha.
Para saber mais sobre suas propostas e ideias para a Prefeitura e a cidade, o DCI realizou uma entrevista com Guilherme Boulos. Confira abaixo:
“Política de um jeito diferente”
Por conta da ascensão de movimentos de direita e problemas internos de partidos de esquerda, muitos eleitores da cidade de São Paulo perderam a confiança em candidatos da esquerda. Como você pretende restaurar essa confiança perdida?
Guilherme Boulos: Nos últimos anos, cresceu um sentimento entre o povo de descrença profunda com a política, de ver que pessoas que eles acreditaram chegaram nos cargos e a situação não melhorou. O que a nossa campanha está mostrando é que dá para fazer política de um jeito diferente, com olho no olho junto do povo. Eu e Luiza Erundina não temos marqueteiro, somos gente de carne e osso, não fazemos da política nossa carreira mas sim uma missão de vida de melhorar nosso país. É por isso que nossa campanha está crescendo tanto; nós restauramos não só a confiança, mas a esperança nas pessoas de que dá pra ser diferente, não precisamos ficar presos no mesmo de sempre, vamos virar o jogo em São Paulo.
Sua ligação com o MTST é importante para sua carreira e, inegavelmente, relevante como fator de escolha dos eleitores. Como seria a relação do Município com este e outros movimentos populares durante sua gestão?
Guilherme Boulos: Eu não vou governar fechado em um gabinete com ar condicionado do centro de São Paulo, eu vou continuar andando pelas periferias para escutar o povo. Nós não vamos governar de costas para a população, como muitos prefeitos fazem, recebendo grande empresário com tapete vermelho e movimento social com bomba de gás lacrimogêneo. Na nossa gestão, as demandas do MTST assim como de outros grupos serão ouvidas, discutidas, recebidas.
A chapa Guilherme Boulos e Luiza Erundina
Em sua campanha há um contraste muito interessante entre você e sua vice, Luiza Erundina. Enquanto você nunca exerceu um cargo público, ela já atuou em diversos mandatos – inclusive, como prefeita de São Paulo. Como surgiu a ideia para essa chapa? E, caso sejam eleitos, como será a atuação de Erundina na Prefeitura?
Guilherme Boulos: Eu e Luiza Erundina nos conhecemos melhor durante as eleições de 2018. A força e energia dela são contagiantes e desde então, estabelecemos um elo muito forte. Nós temos uma trajetória que pode parecer diferente, mas compartilhamos algo muito mais profundo, que é o sentido que damos às nossas vidas. Luiza saiu do sertão, veio para São Paulo, fugindo da ditadura, foi para as favelas lutar por uma vida digna para o povo; eu saí de uma vida confortável de classe média para lutar com os sem-teto. Ela foi a melhor prefeita que essa cidade já teve e possui toda a experiência necessária de governar; eu tenho energia, força e compromisso com a luta. Foi assim que surgiu nossa chapa, dessa comunhão de valores, ideais e objetivos.
Mudanças a serem realizadas em um possível mandato de Guilherme Boulos na prefeitura
O que você mudaria na gestão atual? Manteria algum aspecto?
Guilherme Boulos: Nosso projeto de cidade e de vida é completamente oposto ao dos tucanos, que estão aí comandando São Paulo desde o tempo das capitanias e deu no que deu. Somos a terceira cidade que mais morreu gente de Covid-19 no mundo, temos mais de 25 mil pessoas morando nas ruas, milhares passando fome, quase 1 milhão de pessoas na extrema pobreza, espera de meses para conseguir uma consulta médica, falta de vagas em escolas, ruas e praças abandonadas e isso na cidade mais rica do Brasil e da América Latina. Não acreditamos na forma que eles fazem política, de costas pro povo, aliado aos grandes, cheios de esquemas e nem nos seus objetivos.
Caso seja eleito, quais serão suas principais revisões ao Plano Diretor Estratégico?
Guilherme Boulos: Vamos garantir uma cidade para pessoas e não para o lucro de empreiteiras. Em nossa gestão, o Plano Diretor será revisto com ampla participação popular com assembleias em cada subprefeitura para que o povo seja efetivamente ouvido. Defendemos quatro medidas principais: 1) coeficiente de aproveitamento unitário e atualização do fator de cálculo da outorga onerosa e da cota de solidariedade, aumentando os recursos do Fundurb; 2) defesa das Zonas Rurais, onde vamos estimular o desenvolvimento de agricultura agroecológica, e das ZEIS; 3) expansão do perímetro do Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios para garantir a função social da propriedade; e 4) revisão de todos os Projetos de Intervenção Urbana (PIU) e Operações Urbanas.
A ideia de Guilherme Boulos para a revitalização do Centro
A região central é simbólica de alguns dos maiores desafios urbanísticos da cidade. Qual sua proposta para revitalizar a área e buscar resolver o subaproveitamento de lotes na região?
Guilherme Boulos: Nossa principal proposta para o centro de São Paulo é a requalificação de imóveis abandonados para moradia popular e outros projetos públicos, como academias e espaços culturais. Não dá para deixar que a área central repleta de infraestrutura e equipamentos públicos esteja abandonada e subutilizada quando tanta gente não tem um teto e mora em locais inadequados. Assim, resolvemos de uma só vez o problema de segurança do centro e do déficit habitacional que assola São Paulo. Além disso, ao diminuir a distância das pessoas de seus trabalhos, melhoramos também o trânsito.
Como sanar efeitos da pandemia
Como você pretende ajudar as pequenas e médias empresas municipais durante o contexto de retomada pós-pandemia?
Guilherme Boulos: O Bolsonaro disse que iria salvar a economia e o Doria/Covas, as vidas. No final, não salvaram nem as vidas nem a economia. O Covas implementou a quarentena em São Paulo sem dar as condições mínimas para as pessoas ficarem em casa e sem qualquer auxílios aos micro, pequenos e médios empresários. Todos ficaram abandonados à própria sorte. Eu acompanhei de perto o perrengue do Sidônis, que tem um mercadinho do lado de casa lá no Campo Limpo. Faltou muito pouco para ele não fechar as portas durante a pandemia. Só não faliu porque a turma do bairro foi ponta firme.
Para reaquecer a economia, é preciso ter dinheiro rodando. É por isso que, no dia primeiro de janeiro, eu e Luiza Erundina vamos criar o Renda Solidária para até um milhão de famílias que vivem na extrema pobreza na cidade mais rica do país. Esse dinheiro vai ser gasto pelo povo em supermercados, farmácias, açougues. Além disso, garantir uma ampla renegociação e isenção temporária dos impostos e taxas municipais de microempresas e pequenos comerciantes atingidos pela pandemia para que os comerciantes saiam do sufoco criado pelo descaso que vivemos durante a pandemia.
Guilherme Boulos e o processo eleitoral
Dentro desse processo eleitoral há um fator interessante entre os candidatos: alguns optam por não mencionar o presidente Bolsonaro e outros preferem apoiar ou atacar ele. No Café com Boulos, e em sua campanha, há diversas críticas à administração do presidente. Por quê você opta por essa abordagem? Não seria preferível que seu foco se mantivesse em questões da cidade de São Paulo?
Guilherme Boulos: Eu não faço política de quatro em quatro anos e nem me posiciono de acordo com o que os marqueteiros acham melhor. Não é de hoje que estou criticando Bolsonaro e seu projeto genocida, atrasado que está destruindo o país. Em 2018, fui um dos únicos a denunciar incessantemente a ameaça que ele representava para o povo. Hoje, é o que vemos com escândalo do Queiroz, milícias, gabinete da rachadinha e do ódio. Ele que continua tratando com descaso a vida do brasileiro, chamou a Covid de “gripezinha”, disse “e daí? não sou coveiro” quando temos mais de 150 mil mortos, está deixando queimar nossas florestas. Não posso me calar diante disso.
Caso seja eleito, você pretende terminar o seu mandato? Ou tentaria se eleger como Governador (ou até presidente) como outros já fizeram?
Guilherme Boulos: Com certeza, não sou que nem uns que até assinam compromisso de término de mandato mas largam no meio, de olho em um cargo maior.
Uma análise econômica do candidato
Um dos livros em sua estante nas gravações do Café com Boulos é “O Capital no Século XXI”, de Thomas Piketty. Uma das grandes teses do livro é que a criação de um imposto global sobre capital pode ajudar a sanar as desigualdades econômicas. Alguns economistas e jornalistas consideram essa abordagem de Thomas Piketty irreal. Acha que há alguma maneira de tornar isso realidade? Qual seria uma alternativa mais próxima da realidade do Brasil e São Paulo?
Guilherme Boulos: Até a Financial Times, revista por excelência do capitalismo, publicou editoriais falando que o neoliberalismo foi longe demais e que está na hora de distribuir renda. O FMI está recomendando impostos sobre grandes fortunas e tem gente no Brasil chamando isso de “irreal”. Não dá para aceitar que seis bilionários brasileiros concentram a mesma riqueza de metade da população brasileira, os 100 milhões de brasileiros mais pobres do país. No Brasil, hoje, a classe baixa e classe média pagam impostos altos, mas a classe alta ganha isenções e descontos. Enquanto todos os carros pagam IPVA, os jatinhos dos bilionários não pagam um real sequer de impostos; enquanto os salários são taxados, quem ganha lucros e dividendos está isento.